terça-feira, 12 de junho de 2007

Gaspachos



Apesar de assumida e orgulhosamente português, o meu pai era também um apaixonado por Espanha. Habituou-nos, desde crianças, a amar esse país em tudo tão diferente do nosso. Graças às muitas viagens didáticas (e divertidas!) que fazia connosco sempre que havia uns dias livres e o orçamento o permitia, ficámos a conhecer Espanha palmo a palmo, quase tão bem quanto Portugal. A coisa era bem negociada: por cada monumento ou local de interesse cultural visitado, partilhando sempre connosco os seus profundos conhecimentos de história (a sua maior paixão), podíamos gozar uma tarde de compras ou de praia, conforme a época e o local. E tudo acabava, invariavelmente, num dos fantásticos restaurantes do seu culto pessoal.
Era um gourmet de eleição e conhecia, em cada cidade de cada país, o lugar onde melhor se comia. Assim, os itinerários contemplavam obrigatoriamente esse parâmetro. Sítios onde a cozinha não lhe agradasse eram sempre preteridos. Só ia se tinha mesmo que ser, por exemplo por motivos de trabalho, e ficava o mínimo tempo possível. Dos países nórdicos, por exemplo, fazia uma descrição sintética que nos divertia: "tudo muito bonito, muito civilizado, menos a comida, que é pré-histórica".
Lembro-me de uma vez em que fui com ele (e com a minha mãe, dessa vez só eu) numa viagem que lhe ofereceram a propósito de um voo inaugural da British Airways. O programa incluía 2 semanas de sonho (para mim, que não conhecia nada daquilo ainda), uma em Londres e outra na Escócia. Eu tinha 15 ou 16 anos, Londres era naturalmente um fascínio. Pois bem: a primeira semana lá se cumpriu, visitando os sítios da praxe e passeando pelas ruas. Mas no princípio da segunda, já em Edinburgo (depois de termos visitado um ou dois castelos e de quase termos morrido de frio), o meu pai decidiu que não aguentava mais aquela comida que sabia toda ao mesmo, ou seja, a "sebo de carneiro". Voámos para Madrid para gozar os dias que faltavam, e "aterrámos" literalmente no Paco, um dos seus restaurantes preferidos lá. Só depois dessa magnífica refeição lhe vi de novo um sorriso feliz, que os "sebos" ingleses tinham apagado.
Tudo isto para dizer que a cozinha espanhola, além da portuguesa tradicional (e, claro, também alguma francesa e italiana), esteve muito presente na formação das minhas preferências gastronómicas. Em casa comia-se muitas vezes gaspacho, por exemplo. Tínhamos muito tomate fresco, à borla, e havia que aproveitar o que não custava dinheiro. Continuo a fazê-lo, no Verão, quando apetecem comidas frias. Além da receita tradicional com tomate (aqui deixo a que se fazia lá em casa), há mil variantes de gaspacho na Andaluzia. Por isso resolvi juntar uma outra, chamada Ajo Blanco, feita com amêndoas e também deliciosa.

1. Gaspacho de Tomate

Bate-se muito bem, num copo misturador: 1 kg de tomates maduros (com pele mas sem sementes), 1/4 de pimento verde, 2 ou 3 dentes de alho (conforme o tamanho e o gosto), o miolo de um papo-seco embebido em vinagre e um copo pequeno (de vinho) de azeite bom. Quando estiver tudo bem desfeito e cremoso, junta-se alguma água (ou cubos de gelo) se estiver muito grosso, tempera-se de sal e pimenta e vai ao frigorífico até servir. Deve ficar de uma cor alaranjada. Serve-se bem gelado, acompanhado de várias taças com cubinhos pequenos de: pão torrado (podem ser croutons de compra), pimento encarnado e verde, cebola, ovo cozido, pepino e presunto.

2. Ajo Blanco

Substitui-se o tomate e o pimento do gaspacho anterior por 200 gr de amêndoas peladas, acrescentando também um pacote de natas. Bate-se muito bem até ficar bem cremoso e junta-se ao creme um pouco de água ou leite, a gosto, se estiver muito grosso. Tempera-se de sal e pimenta e vai ao frigorífico. Serve-se gelado, com bolinhas de melão ou uvas moscatel peladas.

5 comentários:

Fer Guimaraes Rosa disse...

gostei muito desse gazpacho branco! :-)

ana v. disse...

Meu Deus, Fezoca, quanta honra a sua visita a este blog!!
Espero tê-la por cá muitas mais vezes, viu? Volte sempre.
Adoro o seu "chucrute", que será o primeiro a figurar na minha lista de blogs, assim que eu fizer uma.

beijo
ana

Anónimo disse...

É a primeira vez que vejo alguém a fazer o gaspacho igualzinho ao meu, e ao da minha mãe.
O meu pai era, penso, secretário de 2ª, dizia-se naquele tempo em que esteve no corpo diplomático, e foi colocado em Espanha.
Não vou dizer há quantos anos, mas há mais do que a idade que tens.
É raro não a ter feita no frigorífico.

ana v. disse...

Engraçado, Marta!
Sabia que estes são gaspachos verdadeiros porque as receitas são espanholas. Mas há tantos! É giro serem iguais aos da tua família.

Já deves ter percebido, pelos meus comentários, que estou a ler os teus de cima para baixo...

Anónimo disse...

grrrrrrrrrrr detesto nisso sou portuguesíssima. sopa de feijão e penca à lavrador. há lá coisa melhor?